Durante séculos e até hoje, a poesia (masculina) sobre as mulheres compara estas com flores, ou pelo menos rodeia-as das ditas nos seus enlevos de objetificação. Pois aqui está uma formação musical feminina que no seu próprio nome, reforçando a assumida e intencional circunstância de ser constituída apenas por mulheres, num meio – o da música improvisada – que é dominado por homens, subverte esse fator botânico. Lantana se chama, fazendo referência às flores que nascem espontaneamente na natureza. Flores infestantes, daninhas, indomáveis.
O uso de herbicidas e a introdução de insetos para controlo da sua disseminação não as afeta e o gado que delas se alimente fica doente. Para Maria do Mar, Joana Guerra, Helena Espvall, Maria Radich, Anna Piosik e Carla Santana a música que tocam não precisa de conter mensagens mais explícitas (a voz de Radich é um instrumento como os demais): aquilo a que vêm enquanto conceito e projeto não podia ser mais claro, pela atitude de inconformismo, rebeldia e contestação em forma de música, tão inerente a esta que não precisa de ser outra coisa que não som organizado. Uma música orgânica e rizomática feita de florescências selvagens e que irrompem espontaneamente da terra, uma música que não se submete a estereótipos, que explora, que invade, que contraria, que desestabiliza, inclusive as próprias coordenadas do que reconhecemos como “música improvisada”, a tal corrente criativa que tão exclusivistas manifestações – coisa “de rapazes” se diria – vem tendo desde finais da década de 1960.

(Texto de Rui Eduardo Paes)